quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Lulu 6.0

Este ano em que Lulu Santos completa seis décadas de vida promete: o popstar, que acaba de lançar a caixa retrospectiva com quatro CDs ‘Toca Lulu’, prepara um disco com músicas de Roberto e Erasmo e outro de inéditas, além de voltar ao ‘The Voice Brasil’.


No dia 4 de maio, você completa 60 anos de idade. De carreira, já são mais de 30, mas parece que você nunca esteve tão popular, concorda?
- Já tinha me esquecido como era despertar tanto a atenção, e isso se deu graças ao ‘The Voice Brasil’. Ainda não tenho contrato assinado, mas está tudo acertado para que mantenham Claudia Leitte, Carlinhos Brown, Daniel e eu em 2013. A segunda edição vai durar um mês e meio a mais. Serão 19 programas, contra os 13 da primeira.

Como se sente chegando a seis décadas de vida?
- Me sinto bem com a minha idade e isso basta. O lance é saber como usar o seu equipamento, e o meu está muito bom. Faço minha ginástica em casa. Preciso disso, porque para fazer meu show, que tem mais de duas horas, é preciso preparo físico. No aniversário, não vou fazer festa, nunca comemorei essas datas redondas.

Mas você acaba de ganhar de presente uma caixa de CDs comemorativa...
- Era para reunir todos os meus discos, mas eu vi uma caixa do Michael Jackson apenas com suas principais canções divididas por temas. Foi a inspiração para fazer a minha. Acho desnecessário juntar meus vinte e tantos discos de carreira, além de ficar caro para o consumidor. O Roberto Carlos lançou agora um CD com quatro músicas por um preço acessível e vendeu milhões. Fico feliz que um formato alternativo tenha alavancado novamente as vendas de discos.

Falando nisso, para este CD o Roberto recrutou dois músicos de sua banda...
- Nem me meti nisso. Ele foi direto aos músicos e convidou. Eu só os alertei sobre as cores que deveriam usar na presença dele.

O projeto no qual você canta Roberto e Erasmo Carlos vai virar CD?
- Sim. Meu Carnaval vai ser trancado no estúdio gravando isso, para lançar até o meio do ano.

E quando podemos esperar um disco de inéditas?
- Já tenho um pronto. Faz um ano que gravei, mas tive um debate interno sobre esse disco e ele vai sofrer uma cirurgia brutal, vou tirar umas coisas e colocar outras. Hoje, estou mais criterioso. Se tivesse sido sempre assim, teria lançado menos discos.

Já pediram ‘toca Raul’ no seu show?
- Com certeza, isso acontece sempre, não é? Mas o título da minha caixa veio dos pedidos para tocar minhas músicas nos shows que fiz em homenagem a Roberto e Erasmo. LSM (foto: Guto Costa)

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Arara funkeira

DJ Sany Pitbull grava com Sérgio Mendes, Liminha e BNegão uma versão de ‘País Tropical’ para a trilha de ‘Rio 2’

A arara-azul Blu chega ao Rio de Janeiro na noite de Réveillon e dá um voo panorâmico pela cidade ao som de uma versão de ‘País Tropical’, de Jorge Ben Jor, tocada pelo piano de Sérgio Mendes, a guitarra de Liminha, a voz de BNegão e o batidão do DJ Sany Pitbull. Foi essa cena que o diretor Carlos Saldanha apresentou ao funkeiro em um storyboard (série de ilustrações em sequência com o objetivo de pré-visualizar um filme) para que ele preparasse seus beats para a trilha de ‘Rio 2’, a continuação da aclamada animação.

“Para este novo filme, o Sérgio Mendes está fazendo uma grande pesquisa dos ritmos de todo o País. A estreia está programada para as vésperas da Copa do Mundo de 2014, então a ideia é mostrar a música do Brasil inteiro”, antecipa Pitbull, que é referência do funk. “Ele quer fazer misturas, colocar batidas eletrônicas com os tambores da Mangueira. Essa será a síntese do filme: mostrar que o branquinho pode gostar de samba e que o pretinho pode ouvir rock numa boa”.

Sany Pitbull com Sérgio Mendes, o técnico de som do filme, Carlos Saldanha e Liminha

Se tudo caminhar conforme o previsto, esta versão de ‘País Tropical’ deve ser apresentada na abertura ou no encerramento da Copa. Será um ponto alto na trajetória de Sérgio Reis Silva (seu nome de batismo), 44 anos, nascido em Nova Iguaçu e criado em São Cristóvão sempre em um ambiente bastante musical. “Meu pai gostava de moda de viola e minha mãe, de John Travolta. Dependendo de qual música estava tocando em casa, eu já sabia quem estava cozinhando”, recorda o DJ.

Além de discotecar pelos quatro cantos do Brasil, Sany Pitbull é professor de produção musical do projeto ‘Red Bull Favela Studio’ em Vigário Geral, produz e compõe trilhas para o cinema, programas de televisão e desfiles de moda. “As pessoas acham que é uma vida de glamour, de dinheiro fácil e de pegar mulher, mas é um trabalho duro ser DJ. No mesmo dia em que enterrei minha mãe, eu ainda reuni energias para ir tocar e não furar um compromisso profissional”.

Pitbull é também um dos principais responsáveis por exportar o batidão do funk carioca mundo afora. Este ano, ele planeja voltar à Estônia, Finlândia e Suécia. “Quanto mais frio o país, mais quente é o público”, descreve ele, ressaltando que a experiência internacional está mudando sua música. “Estou cada vez menos funkeiro. Sempre que viajo, volto com novas referências e misturo tudo isso no meu som”.

E as portas não param de se abrir para ele. “Só me atrapalha um pouco o nome artístico que adotei. Por causa do Pitbull, que herdei da equipe de som onde comecei, acham que sou brigão, mas eu sou um cara supertranquilo, caretão, nem álcool eu bebo”, diz.

Astral boa-praça, ele conta, quem também possui é Sérgio Mendes. “No encontro para a gravação de ‘País Tropical’, eu cheguei tímido, enquanto ele disparou, com um sorriso: “Você que é o Pitbull dos botões?!’. Me deixou bem à vontade, logo vi que o coroa não tem nenhuma marra”, relata.

VIGÁRIO GERAL
Sany Pitbull está fazendo escola. Toda semana ele, que atualmente é pai de dois filhos e mora em Botafogo (“Na Zona Sul a gente está mais perto das coisas, mas as pessoas são muito frias”), vai ao Centro Cultural Waly Salomão, em Vigário Geral, ensinar jovens carentes, com idades entre 17 e 23 anos, que sonham seguir carreira como DJ.

“As aulas lá vão do disco de vinil ao iPod. E já dá para destacar vários talentos, como o David Fernando, um garoto de 19 anos que foi terceiro colocado na Olimpíada de Matemática das escolas públicas. Mixagem nada mais é que matemática pura. Ele chegou no curso dizendo que queria ser o DJ de sua comunidade. Hoje, ele olha para mim e fala: ‘Agora eu quero tocar em Londres, que nem você’”, conta.

Entre tantas atividades nacionais e internacionais, é o projeto na comunidade, chamado ‘Favela Studio’, o que mais encanta Sany Pitbull. “O que mais gosto de fazer é estar lá e ver os olhos daqueles moleques brilhando. Isso me completa mais que a possibilidade de tocar na abertura da Copa, pode acreditar”, garante o DJ. LSM (foto: João Laet; arte Fernanda Precioso)

sábado, 19 de janeiro de 2013

Aquarela do Ary Barroso

Diogo Vilela encarna o compositor em peça

Ary Barroso (1903-1964) foi mesmo um cara genial. Entretanto, até hoje pipocam gaiatos classificando o verso “esse coqueiro que dá coco”, de ‘Aquarela do Brasil’, a mais conhecida canção do compositor, radialista, locutor esportivo (flamenguista doente), jornalista e vereador (ufa, o cara fez de tudo um pouco!), como o pior da música brasileira. “O próprio Ary achava isso”, assume, às gargalhadas, o ator Diogo Vilela. “O cunhado dele ficava criticando essa parte da música, mas ele não quis mudar. Dizia que a redundância era uma licença poética”.

Vilela encarna Ary Barroso como protagonista em ‘Do Princípio Ao Fim’, assina a direção e (pela primeira vez na carreira) o texto da peça (com a supervisão artística de Amir Haddad). O espetáculo está em cartaz até 31 de março no Teatro Carlos Gomes, na Praça Tiradentes. Foi lá que, nos anos 20, Ary trabalhou como pianista. O compositor, que era mineiro, se encantou pelo Rio e daqui nunca mais saiu. “Na peça, ele está no leito de morte e confronta sua obra no final da vida, fazendo ajustes de contas com várias das personagens de sua época, como Lamartine Babo, Aracy Cortes e Carmem Miranda”, descreve.


Não está em ‘Do princípio Ao Fim’, porém, a histórica treta que Ary teve com a ainda iniciante Elza Soares — quando ela foi se apresentar no programa dele, o mineiro perguntou: “De que planeta você veio?”. Ao que Elza, com 16 anos, rebateu: “Do planeta fome”. “O Ary era vaidoso e arrogante, e tudo sobre esse lado de seu temperamento eu levei para o palco. Ele era um crítico severo, e achava que tinha que ser assim, que desta forma contribuiria para elevar o nível da música brasileira”, conta Vilela.

Mas diversas outras passagens marcantes estão lá, como a aposta curiosa com o tricolor Haroldo Barbosa, no Fla-Flu de 1955, quando o Rubro-Negro perdeu e Ary foi obrigado a raspar o bigode (símbolo de elegância na época) que usava havia 30 anos. “Eu sou Flamengo, mas alguns atores do elenco que não são sofrem quando têm que cantar o hino na peça. Eu digo: ‘gente, segura a onda e tudo pelo Ary!’”, diverte-se.

Em cena com Diogo Vilela, estão nomes como Tânia Alves (que interpreta a mulher de Ary Barroso, Yvonne) e os cantores Marcos Sacramento e Mariana Baltar. Estes dois últimos integram uma recente geração de sambistas que despontaram na revitalização da Lapa. “Tem muita gente jovem que se identifica com esse resgate histórico, embora um nome como Ary Barroso ainda seja mais valorizado entre a classe dos músicos. Por isso seu talento precisa ser reafirmado. Tem gente que até hoje acha que ‘Rancho Fundo’ é uma canção do Chitãozinho & Xororó e não é, é uma parceria do Ary com o Lamartine Babo”, ensina.

Para montar o espetáculo, o ator fez um sério trabalho de pesquisa, e mostra que está afiado sobre o assunto. Voltando à ‘Aquarela do Brasil’, Diogo Vilela esclarece de pronto as dúvidas do repórter sobre palavras usadas pelo autor no célebre samba-exaltação das nossas belezas naturais, como ‘mulato inzoneiro’, ‘merencória luz da lua’ e ‘morena sestrosa’. “Inzoneiro é manemolente, merencória é melancólico, e sestrosa é manhosa. Ele gostava de usar essas palavras pouco usuais”, explica. LSM (fotos Maíra Coelho e Hugo Cecatto)

sábado, 12 de janeiro de 2013

Todas as Marinas

Marina Lima volta ao Rio em show, exposição e livro, e conta que mudança em sua voz foi causada por um erro médico, e não por uma depressão pela qual passou


Em 2010, Marina Lima trocou o Rio, onde nasceu, por São Paulo. Na próxima quarta-feira, porém, a cantora volta à capital carioca em dose tripla: no Centro Cultural João Nogueira, no Méier, ela faz show, inaugura exposição sobre sua vida e lança o livro ‘Maneira De Ser’ (ed. Língua Geral, R$ 53, 232 págs.), uma autobiografia nada ortodoxa. “Considero meu trabalho musical muito original. Daí, não queria fazer uma biografia comum, cronológica. Não queria contar minha vida toda, mas tornar públicas algumas coisas que me interessam”, explica.

Marina sempre falou abertamente sobre assuntos polêmicos, como sua bissexualidade, drogas e política, e no livro não é diferente. “Ser autêntica tem um preço. Aliás, tudo na vida tem um preço, até não ser verdadeiro. Mas vale a pena. Quando você tem a coragem de se expor, por mais que traga algum risco, a gente se sente contribuindo, ajudando as pessoas a formarem a sua própria opinião e de repente mudar o mundo. Essa sensação é que não tem preço”, define.

Na publicação, ela só não expõe os reais motivos que causaram a nítida mudança que ocorreu em sua voz — fato sempre creditado à uma assumida depressão que teve nos anos 90. “Nunca falei disso porque demorei muito para descobrir o que houve. Tive depressão realmente e, na mesma época, peguei uma gripe forte e tive que fazer uma aspiração de pus na garganta, mas não dei muita importância a isso. Mesmo depois que a depressão passou, continuei a sentir dificuldade de cantar, de respirar até, mas só recentemente descobri que havia uma fenda na minha garganta. Só pode ter sido causa de um erro médico naquela ocasião, afinal, como uma fenda aparece de uma hora para outra na sua garganta?”, questiona. “Não tenho raiva do médico, tive uma frustração, claro, mas fiquei acima de tudo aliviada por perceber que o problema da voz não era coisa da minha cabeça”.

SÍMBOLO SEXUAL
Sua voz rouca é uma de suas marcas. Mas não a única: Marina Lima sempre gostou de moda e lançou tendências. “Sapatos são meu ponto fraco, mas também curto muito roupas e maquiagem. Presto atenção e garimpo o que me cai bem”, relata. “A moda traduz muito o que você é, indica a que tribo você pertence ou ao menos qual seu estado de espírito naquele dia”.

No auge da fama, ela foi considerada símbolo sexual, indo parar até na capa da ‘Playboy’. “Não me achava isso, não. Mas foram me convencendo que eu era, e a parte mais chata da minha vida foi quando acreditei nisso. Fiquei meio mascarada, não foi bom para mim. Não posaria nua de novo. Foi importante quando eu tinha 44 anos, mas agora, aos 57, no máximo posso pensar em um dia fazer um daqueles ensaios sensuais. Mas nua, não”, decreta.

MOSTRA E SHOW
A exposição sobre Marina Lima leva o mesmo nome de seu livro, ‘Maneira de Ser’, e fica três meses em cartaz no Centro Cultural João Nogueira. “Acho que o grande destaque da mostra será a exibição, em uma sala especial, do DVD que registra meu show ‘Primórdios’, dirigido por Monique Gardenberg em 2006 e que nunca foi lançado”, antecipa. “Depois que sair de cartaz, acho que vou querer lançar esse DVD oficialmente. Tenho também outro DVD inédito, prontinho, do meu show mais recente, ‘Clímax’. Penso em lançar uma caixa dupla com esse material todo”, anuncia.

No mesmo dia da estreia da exposição, quarta-feira, Marina Lima canta seus sucessos no Imperator — a sala de shows do Centro Cultural João Nogueira. A apresentação marca sua volta ao palco da Zona Norte depois de mais de 20 anos. Foi lá que, em 1991, ela fez o show de lançamento do disco ‘Marina Lima’. “Este foi o primeiro disco em que assinei ‘Marina Lima’ (antes ela usava apenas Marina)”, ressalta. “No show, a Letícia Novaes, do grupo Letuce, vai cantar ‘Grávida’, vai ser muito especial”, conta, quase confundindo o repórter, que se surpreende ao achar que a Letícia está esperando bebê. “Não!”, descarta ela, às gargalhadas. “Ela vai cantar a minha música ‘Grávida’”, explica. Ah, bom! LSM

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Pretinho do bom

Arlindo Cruz pilota roda de samba com feijoada e dá a sua receita

O trânsito do Centro para a Barra da Tijuca é lento, e me atraso para almoçar uma feijoada com Arlindo Cruz em sua casa. “Não aguentei esperar, já comi três pratos antes de você chegar, mas senta aí que eu encaro mais um”, garante o sambista.

Ele, que está em cartaz todo domingo de janeiro no Zozô, na Urca, comandando uma das rodas de samba com feijoada da cidade, dessas que deixam foliões com água na boca, havia prometido — e cumpriu — servir o prato tipicamente brasileiro e dar suas dicas sobre o assunto. “A minha cozinheira, Suely, não me deixa meter a mão na panela, mas eu coordeno tudo muito bem, sou bom de temperos”, gaba-se. “Ela é uma artista, e é a responsável pelos meus quilos a mais”, entrega.

Enquanto a cozinheira Suely Rita de Souza prepara a feijoada, Arlindo fica em cima, de olho. “Ele é muito simples, mas gosta de uma comida bem temperada”, conta ela. Arlindo se derrete: “A Suely adora artista, quando vem um aqui em casa o Facebook dela bomba! Ela é quase uma atriz, ainda vai posar para a ‘Playboy’”, diverte-se.

E, afinal, o que não pode faltar em uma boa feijoada, Arlindo? “Sem dúvida, um bom samba. É indispensável!”, responde de bate-pronto. “Acho que a boa combinação deve-se ao fato de a origem do ritmo e do prato serem coisas de negão, da senzala. Tudo remete à nossa negritude. Já imaginou uma feijoada ao som de música clássica?”, brinca.

O feijão acompanha Arlindo Cruz desde o início da carreira. “Quando comecei a tocar, eu devorava o feijão da Dona Vicentina, da Portela. Comia uns quatro pratos cheios”, recorda ele, que escreveu também um punhado de sambas falando do assunto. “Fiz ‘Feijoada Com Sushi’ para um grupo japonês de samba, o Balança Mas Não Cai, que é tipo um Fundo de Quintal de lá. Também compus ‘O Feijão da Dona Neném’, esta com Zeca Pagodinho. E, no próximo dia 20, vou cantar no programa ‘Esquenta!’, na televisão, ‘Feijoada Completa’, do Chico Buarque”, anuncia.

Hoje, Arlindo desfruta do privilégio de ter a Suely para preparar suas iguarias preferidas. Mas nem sempre foi assim. “Quando era solteiro e morava sozinho, eu tinha que me virar, mas nunca gostei de Miojo. Macarrão é macarrão!”, decreta. LSM (fotos João Laet)

Confira o que não pode faltar na feijoada dessa dupla:
* Feijão preto (claro, mas “colocar louro no feijão é o grande barato”, ensina Arlindo. “Se você comer apenas o feijão e o louro, já fica uma delícia. Além do alecrim, que sempre cai bem”)
* Carne-seca
* Linguiça fina (“Não pode faltar nunca, e não pode ser muito salgada”, ressalta ele
* Paio, lombo, pé, costela, orelha, rabo e toucinho de porco
* Cebola
* Alho (“Muito alho!”, destaca o sambista)
* Acompanhamentos: Farofa incrementada, couve à mineira e laranja. 

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

‘É um horror o peso desse sobrenome’, diz Nana Caymmi

Aos 71 anos, Nana Caymmi continua com a voz e a língua afiadas: “Nunca vi raça para reclamar mais que sambista. É o samba que não pode morrer, é o samba que pede passagem, é o samba que está com diarreia... o samba não se considera, foi a conclusão a que cheguei”, dispara.

Autêntica e naturalmente desbocada, ela é dona de um registro vocal único, forte e cheio de nuances, como atesta a recém-lançada caixa ‘A Dama da Canção’, que reúne 18 discos — com direito a todos os encartes, letras e artes gráficas originais — e mais um CD duplo com 41 faixas, entre raridades e outras pouco conhecidas. Feliz com o projeto revisionista, Nana, porém, já está com a cabeça em seu próximo CD e DVD: um tributo ao centenário de seu pai, o saudoso Dorival Caymmi (1914-2008), a ser comemorado no ano que vem.

“Meu irmão Dori Caymmi que está produzindo isso. Agora, se ele vier com gracinhas, arrumo minhas trouxas e mando ele tomar no c...”, garante, fazendo justiça à sua fama de mulher com temperamento forte e que nunca abriu mão de suas convicções artísticas. “Sou de uma geração que não dava palpite. A mulher era só para trepar. Aí, quando apareceram eu, Elis Regina, esse tipo de mulher que avança, nos chamaram de bravas”.

Nana Caymmi conta que teve que se impor para sobressair dentro de uma família musicalmente tão talentosa. “É um horror o peso desse sobrenome. Não posso jogar em um time desses se eu não for um Messi”, avalia, citando o craque do Barcelona e atual melhor jogador de futebol do mundo. “Com o pai que tinha e os irmãos que tenho, nunca posso fazer algo menor, ou pensando apenas em dinheiro. Já vi produtores falarem: ‘se você quer vender, então tem que cantar esse determinado tipo de música’. Eu ia sentir vergonha se fizesse isso”.

Ao ouvir as gravações antigas de Nana resgatadas na caixa, desde os anos 60 quando era casada com Gilberto Gil, constata-se que sua voz perdeu pouco ou quase nada com o passar das décadas. “Sempre tive muito cuidado com isso. Quem perde a voz com o tempo é porque não se cuida”, decreta.

Mas, Nana, em seu disco de 1977, você aparece na capa em várias fotos fumando um cigarro... “Nunca fumei! Ganhei um isqueiro, aí fiz um tipo para aquelas fotos”, explica.

‘NÃO VI O THE VOICE BRASIL, PREFIRO O SILVIO SANTOS’
Nana Caymmi lamenta a escassez de cantores originais na cena musical brasileira. Ela conta que sequer se interessou, e que viu com desconfiança o recém caça-talentos televisivo ‘The Voice Brasil’. “Eu não sou maluca de assistir isso. Prefiro o Silvio Santos. Gosto daquelas perguntas que ele faz naquele joguinho que tem uma roda. Procurar cantor não me atrai mais, não”, descarta. “E mais: não entendo qual o critério de escolha desses candidatos. Acredito que exista um alto comando ali atrás que decide, ou um teste do sofá... na boa, quem seleciona isso deve ser um bom filho da p...”, reclama.

Outra coisa também incomoda a carioca Nana: a desordem urbana do Rio. “Parece que sofremos uma guerra. Às vezes me sinto nos países árabes. Estou me afastando e indo para Pequeri, em Minas, não aguento o Rio como está. Vamos ver se vai surgir uma nova cidade para a Copa”, torce. LSM

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

A última espiadinha no brother de Jorge Mautner

O ‘Big Brother Brasil’ estreou ontem, mas o filme ‘O Filho do Holocausto’, codirigido pelo ‘capitão’ do reality, Pedro Bial, só entra em cartaz nos cinemas no dia 1º de fevereiro. No entanto, já é possível dar uma espiadinha, ou melhor, uma escutadinha na trilha do longa que conta a história de Jorge Mautner: as músicas que o compositor, cantor, violinista e escritor gravou especialmente para o projeto, acompanhado por integrantes da Orquestra Imperial, acabam de sair em CD.

Mautner, entre Pedro Bial e sua filha, Amora

Apesar da alegria com os lançamentos, assistir a ‘O Filho do Holocausto’ ou escutar sua trilha guarda uma ponta de dor para Jorge Mautner. Este é o último trabalho com a participação do seu grande amigo e parceiro Nelson Jacobina (1953-2012), que morreu vítima de um câncer no pulmão, aos 58 anos.

“Me emociona muito, ainda vou às lágrimas revendo o filme. Conheci o Nelson em 1972, ele tinha 16 anos e logo começamos a compor juntos. A vontade dele de tocar era o que o fazia viver. Mas sinto que ele está comigo o tempo todo. Teria que escrever um livro de mil páginas para descrever o que sinto por ele, não existe quem o substitua”, decreta.

Com Jacobina, que também integrava a Orquestra Imperial, Mautner escreveu boa parte de suas canções, entre elas ‘Maracatu Atômico’, sucesso nas versões de Gilberto Gil e de Chico Science & Nação Zumbi. “Depois que o filme estrear, vou sair em turnê, mas nos shows estarei acompanhado pelo grupo Tono, que é a banda do Bem Gil, filho do Gilberto Gil, e não pelos músicos da Orquestra Imperial”, conta Mautner.

É que a agenda da big band carioca capitaneada pelos músicos e produtores Kassin e Berna Ceppas é bem concorrida. Mas com Bem Gil, Mautner está praticamente em casa.

“Eu o vi nascer. O (Gilberto) Gil é um amigo de longa data, e ele está no filme, cantando e dando depoimentos, assim como Caetano Veloso”, lista.

VICIADO EM ‘AVENIDA BRASIL’
Apesar de ter sido dirigido por Pedro Bial, é pouco provável que Jorge Mautner seja um espectador assíduo do ‘Big Brother Brasil’. No entanto, ele revela que ficou grudado na televisão para assistir a novela-fenômeno ‘Avenida Brasil’. Também pudera: sua filha, Amora Mautner, assinou a direção da trama.

“Acompanhei de perto, e às vezes pedia para ela me antecipar o que aconteceria nos capítulos seguintes, mas confesso que o impacto era maior quando ela não me contava”, diverte-se.

E foi só dar linha no assunto da participação da filha na novela para o pai coruja desandar a falar: “Sem tirar os créditos de todos os envolvidos na produção, mas muito do sucesso de ‘Avenida Brasil’ é mérito dela, não é? Ela é muito talentosa, e trabalha muito desde os 16 anos”, derrete-se. LSM

domingo, 6 de janeiro de 2013

Foco na batucada

Livro reúne imagens de democráticas rodas de samba do Rio e documenta a comunhão entre os músicos e o povo 

Os músicos estão lá no centro, a postos com seus tamborins, pandeiros e surdos. Ao redor, como que completando a big band informal, dezenas de anônimos que se integram à cantoria e à batucada. Assim são as rodas de samba, e foi este espírito democrático que inspirou o fotógrafo carioca Luiz Lima. Ele reuniu imagens que registrou em um punhado desses encontros musicais no livro ‘Rodas’ (Ed. Blurb, 80 págs, R$ 105).

Morro Dona Marta, roda Pôr do Santa

“Na roda de samba, ao contrário de um show onde tem um palco, todo mundo faz parte da apresentação. A emoção vai muito além dos instrumentistas, pois todos são personagens importantes do círculo que se faz ao redor das mesas, sambando, batendo palmas e ajudando no andamento”, ressalta Lima. “Só fiz fotos das rodas que são gratuitas, porque acho que o espírito original é esse, de chegar e curtir o som sem compromisso”.

Pedra do Sal

A obra reúne 77 imagens documentais de algumas das populares rodas de samba que acontecem em variados lugares da cidade. “Cada uma tem suas particularidades. Na roda Pôr do Santa, no morro Dona Marta, em Botafogo, o visual lá de cima é o mais bonito entre todas as que já vi. O Cacique de Ramos é uma das mais clássicas, e destaco também o Samba da Chaleira, no Cachambi, onde parece que você está na casa de alguém que conhece faz tempo”, lista ele, que fotografou ainda as rodas Fala Meu Louro, no Santo Cristo; da Pedra do Sal, na Praça Mauá; do Beco do Rato, na Lapa, entre outras.

Cacique de Ramos

‘Rodas’ só pode ser comprado através do site Blurb (www.br.blurb.com), uma editora que imprime por demanda. “É o futuro. O mercado dos livros está criando este hábito de compras, assim como o da música, que já vem sendo vendida amplamente pela internet”, compara. LSM (fotos Luiz Lima)

Samba da Chaleira