quinta-feira, 19 de junho de 2014

Sem perder a ternura

Wanderléa, procure saber, não é só a Ternurinha eternizada pela Jovem Guarda, quando protagonizou com Roberto e Erasmo Carlos o movimento musical pioneiro do rock brasileiro nos anos 60. Em sua discografia, há títulos que pouco ou quase nada remetem ao tipo de som que fazia naqueles tempos. Um desses discos é ‘...Maravilhosa’, de 1972, que a cantora revisitou 40 anos depois no Teatro Municipal de São Paulo, atendendo ao convite da Virada Cultural paulista, e que agora sai em CD e DVD pelo selo Coleção Canal Brasil.

“Foi um marco, né? Às vezes ficamos estigmatizados como artista de um gênero só, mas o que fiz ali não era parecido com nada que já havia feito”, reavalia Wanderléa. “Com esse trabalho, eu mergulhei em um universo musical novo para mim, misturando o rock com o soul, o samba e o chorinho. As pessoas estranharam muito, tanto o repertório como a performance de palco, eu com uma roupa transparente e o corpo todo coberto de purpurina, era muito ousado. Muita gente não gostou, e na imprensa saiu uma manchete que dizia: ‘Ternurinha, pare agora!’. Mas eu vejo como uma continuidade da minha carreira. Já não era mais uma menininha, eu queria crescer, já era uma moçona.”

A história completa desse que é o seu primeiro lançamento após o fim da Jovem Guarda e muitos outros casos de sua trajetória vão ser contados em detalhes na autobiografia que ela anuncia para este ano. “Esse meu livro está escrito há um bom tempo, já desfiz dois contratos, porque desisti de lançar, mas agora a editora Record me pegou pelo pé e finalmente vai sair”, conta. “Só falta definir o título. Seria ‘Soltando os Laços’, depois mudei para ‘Karma e Glória’, mas ainda não escolhi qual será o definitivo.”

Claro que, como amiga íntima de Roberto e Erasmo, que ano passado se juntaram a nomes como Gilberto Gil e Caetano Veloso em um grupo que se manifestou contra a publicação de biografias não autorizadas, ela conseguiu o sinal verde dos antigos colegas da Jovem Guarda para seu livro. “Tenho uma vida ao lado de grandes personalidades, e não lançaria sem a autorização deles. Isso faz parte da nossa ética. Ficamos muito arredios quanto a isso porque, desde os anos 60, as pessoas publicam muitas coisas que não são verdadeiras”, explica.

Ela garante, porém, que não vai omitir de seus futuros leitores certas passagens de sua carreira, como quando Baby do Brasil (que, na época, atendia ainda pelo nome de Baby Consuelo) lhe ofereceu maconha (“Passei tão mal que nunca mais quis aquilo...”) ou os ensaios de Elis Regina e Tom Jobim em sua casa, em Los Angeles, para o célebre disco da dupla, que entraria para a história. “Tem um capítulo inteiro sobre isso, chamado ‘Natal em Pasadena’. O Tom passou o Natal comigo, ele ficava ensaiando o ‘Águas de Março’ no piano de cauda que tinha lá em casa”, descreve.

MEU AMIGO
ERASMO CARLOS

Os três protagonistas do núcleo da Jovem Guarda passaram pela dor de perder um filho, sendo Erasmo a vítima mais recente de tal tragédia, com a morte de Carlos Alexandre, vítima de um acidente de moto. “Sofremos muito, choramos quando falei com ele. Mas temos que continuar”, consola-se ela, cujo filho Leonardo morreu afogado em 1984. “É o trabalho que nos sustenta. A gente tem que aprender a soltar os laços.” LSM

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